14 de junho de 2008

A mulher de vermelho.

Todos os dias, sem excepções, chega curtos segundos antes das oito à estação dos comboios. A cobrir-lhe as pernas, traz sempre umas calças vermelhas bem justas, às quais se sobrepõe um comprido e imponente casaco, também ele vermelho.
Acende um cigarro e pede-lhe que a acompanhe até que apareça o comboio, e ele, obediente, não a deixa sozinha. Enquanto passeia a sua cor vermelha pelos azulejos já velhos da plataforma da estação, o cabelo comprido esvoaça-lhe timidamente sobre as costas, fazendo lembrar o pequeno melro na sua primeira aventura pela independência, enquanto o fumo do cigarro se desvanece na cor azul do céu. Passados sete minutos, os seus olhos pretos avistam o comboio no horizonte imaginário. Ela agradece ao companheiro de espera com uma última baforada, e, em modo de despedida, aconchega-o com o salto pontiagudo do sapato.
O comboio, quase vazio, ou não muito cheio, vai atracando suavemente, esperando que ela se aproxime da sua carruagem predilecta. O lugar inanimado do andar de baixo está ainda vazio, à espera que ela o avive com a sua cor vermelha ao longo da extensa viagem.
Não estranha o cheiro vazio que o comboio traz.
Para aqueles lados nunca foi muita gente.