31 de dezembro de 2010


Let your heart...

run along to the rhythm of your song.


(é a mensagem para o novo ano roubada aos Kings of Convenience.)

18 de novembro de 2010

A rapariga que se alimentava de flores

'(...) Sentir o tempo todo pela frente e o desespero. Não ter coragem para se mexer. (...) Entrar em pânico, respirar como quem sufoca, deixar-se cair da cama para o chão como se do chão já não se pudesse cair para nenhum lado (...). Não ter coragem para se mexer.'
Pedro Paixão, Amor Portátil

E depois ouvir...

'Hold your breath and count to ten. And fall apart. And start again.
Start again. Start again.
Start again.'
Placebo, English Summer Rain

23 de agosto de 2010

To build a home

A minha mente desperta, mas os olhos mantêm-se fechados. Sinto a alma leve, e o coração quente. O meu corpo, demasiado cansado para se mover, tenta adivinhar a posição de cada um dos seus membros, de forma a deduzir a orientação das paredes e o lugar de cada móvel, e assim reconstruir a morada que o abriga.
Tarefa difícil, esta, para um corpo tão cansado. Frágil, pede ajuda ao cantinho da memória que guarda lugares e sensações, pede-lhe que lhe ofereça recordações de todos os quartos por que já passou. E vai-se rendendo à facilidade com que as imagens vão sendo projectadas sob as pálpebras, tal e qual um filme, e com que as sensações vão atravessando as camadas mais profundas da pele. Todo este trabalho, estando apenas a um movimento da realidade.
Os olhos não se abrem, mas, mesmo assim, vêem tudo. À direita, pendurada no centro da parede, a casa de madeira das borrachas que são escovas e pastas de dentes, dados, lápis e afias. À esquerda, ao fundo da cama, a máquina de escrever que ainda guarda as histórias da noite anterior. O chão, cosido de verde-esperança, tal como o jardim lá fora. E as quatro paredes azuis, guardando, cada uma, um segredo diferente. Os olhos vão acreditando nesta realidade, mas o nariz, desconfiado, pede pela confirmação. E, ao sentir o ar respirado a aconchegar as suas paredes, percebe que só se enganou a si próprio. O cheiro que o invadiu é-lhe demasiado íntimo e vivo. Falta-lhe o cheiro do vazio, do abandono. O cheiro a mofo.
E logo se desvanecem as paredes azuis e o chão verde, a casa das borrachas e a máquina de escrever. É pintada, sobre a tela dos meus olhos, outra casa para o meu sono. Cores quentes aconchegam-me a pele e quase me queimam os olhos. O coração, inconscientemente, começa a bater mais rápido e, sem o corpo se aperceber, vão-se escapando alguns batimentos. Do lado direito, começam a ser pintados, sobre as janelas, os cortinados vermelhos e, debaixo de mim, os lençóis azuis. Não estou sozinha. Outro corpo frágil e cansado repousa ao lado do meu. É um corpo vazio. Que está, mas não está. Há muito que o seu coração fugiu do seu corpo. Há muito que não está, mesmo estando. O meu braço esquerdo ganha vida, alimentado pela raiva que circula por todas as minhas veias e as dilata. E percorre a cama, em busca desse corpo ausente, mas não o encontra.
Os meus olhos voltaram a enganar o meu corpo. Estes, já quase sem força para projectar um novo quarto, pensam em desistir, mas o comodismo vence, uma vez mais. Vêem-se pássaros de todas as cores feitos em origami a voar pelas quatro paredes do quarto. Na parede do fundo, o suporte de fotografias trazido do México, que dá casa a algumas das minhas histórias. Mais em baixo, a mochila Monte Campo azul-escura, com um botão no lugar da sua identidade. O chão está coberto por livros e folhas escrevinhadas, e do lado esquerdo, a cadeira de baloiço, que serve de suporte à roupa do dia seguinte: uma t-shirt amarela, all-stars azul esverdeados e calças de ganga já meio gastas. O nariz vermelho repousa ao lado da t-shirt, à espera de tomar o seu lugar entre os meus pequenos olhos castanhos. Na mesa de cabeceira, está o meu telemóvel, que tem como capa um recorte de revista do burro do Shrek e que me acorda todas as manhãs com luzes coloridas e um toque polifónico suficientemente irritante. Com medo que o toque termine com a calma do meu corpo, o meu braço esquerdo, já habituado ao movimento, guia a sua mão até à mesa-de-cabeceira em busca do botão capaz de atrasar, indefinidamente, o meu acordar. A mão esquerda embate, imediatamente, num objecto que se assemelha, em tudo, a um telemóvel. Estranhamente, nenhum dos dedos, ao percorrer todas as arestas e vértices do mesmo, encontra o botão mágico. Nem esse, nem nenhum. O telemóvel não tem botões. Assustado, todo o meu corpo decide despertar, e os meus olhos, demasiado preguiçosos, afastam finalmente as suas pálpebras quentes, como o braço direito afasta os cobertores, deixando a nu todo o corpo.
As paredes estão brancas, os pássaros cansaram-se de voar e levaram com eles as minhas histórias. No lugar da mochila, uma mala castanha não muito grande. O chão está nu. Os livros arrumaram-se, os papéis fizeram-se pássaros e fugiram. A cadeira continua a balançar, mas sem roupa. Abro o roupeiro, mas já não vejo t-shirts nem calças de ganga. As t-shirts são agora blusas e as calças transformaram-se em saias e em vestidos de todas as cores e feitios. Sapatos e sandálias no lugar dos ténis. O nariz vermelho já nem me serve. O telemóvel sem botões começa a despertar. Já não toca às cores, mas ouve-se 'this is a promise with a catch'. Olho para a cama, e não encontro outro corpo. Ouço a música que ainda toca. Acredito na promessa. O coração acalma-se e os meus olhos sorriem. Mas não resisto, e mesmo antes de tomar o pequeno- almoço, trinco um quadradinho de chocolate da tablete esquecida no canto da mesa-de-cabeceira. E mais um, e outro. E fico satisfeita, mas nunca o suficiente. E este é o meu ópio, sempre será.
Enquanto sinto a garganta a arder do doce exagerado do chocolate, os meus olhos viajam uma última vez pelo quarto em que acordaram. Um esqueleto com todos os ossos dos nossos corpos substitui a secretária cheia de livros.
E lembro-me que já sou fisioterapeuta. E o orgulho cresce. E cresce. E muito!
Mas o medo também.

A vida está prestes a começar, como há quem diga.

E ouço cá dentro novamente: 'Finalmente és livre. Podes ser quem quiseres, fazer o que bem te apetecer. Este é O momento e as decisões são só tuas. E se for para arriscar, fá-lo agora, que depois vai ser tarde.'.
E não é fácil. Não é fácil decidir-se quem se quer ser. E piora quando, a cada dia que passa, descubro outra forma para ser, e outra, e outra. Infinitas formas para se ser. Mas apesar das dúvidas e do medo, eu sei bem quem quero ser, e sei o que quero fazer. E o comodismo não me vai matar nunca.
E prometo, vou fazer de tudo para encontrar um nariz vermelho que me sirva. E mesmo quando não existirem mais narizes vermelhos, vou encontrar forma de criar o meu próprio nariz vermelho.

Porque eu não quero, nunca, ser sem nariz vermelho.

1 de maio de 2010

True love will find you in the end

diz o grande senhor Daniel Johnston.
E se ele o diz, eu acredito, pois então.

Afinal ele é O génio.


E parece compreender-me.
Mais ninguém tem um carinho especial pelos filtros dos cigarros, nem pensa que há coisas que duram tempo demais.
Pois não?

20 de fevereiro de 2010

eu sempre soube que o chá estava quente.

foda-se. FODA-SE!
então?
queimei-me!
porque bebeste o chá se sabias que ainda estava quente?
olha que pergunta! sei lá eu. eu gosto deste chá! queria acreditar que não estava tão quente como parecia.
muitas vezes as coisas são mesmo como parecem. já devias saber.


oh, não chores. por favor não chores!
como queres que não chore? isto dói. e dói muito.
mas eu nunca sei o que fazer quando alguém chora ao meu lado. se não te abraçar vais pensar que sou a pessoa mais insensível que conheces. se te abraçar vais chorar, inevitavelmente, o dobro. ou o triplo. eu bem sei como é comigo. sempre que tenho apenas uma ou outra lágrima colada à face e alguém me vem reconfortar com palavras bonitas e abraços está tudo estragado. quando consigo pará-las, já eu estou completamente ensopado, como se tivesse saído de uma grande tempestade.
então não me abraces. não me abraces, que eu tenho medo de tempestades.
e pior, agora tenho medo de beber chá.

e depois, como me aqueço eu?